Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) desenvolveram uma estratégia que utiliza nanopartículas carregadas de produtos químicos para atrair os vírus, impedindo a ligação às células infectadas e a conexão a receptores da membrana celular. Sem isso, os vírus não conseguiriam se reproduzir no organismo. Na pesquisa do CNPEM, que é vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), as nanopartículas ocupam as vias que seriam utilizadas pelos vírus para fazer a ligação com as células, o que causaria infecção. É o primeiro estudo que demonstra a inativação viral baseada em nanopartículas.
“Esse mecanismo de inibição viral se dá por meio da modificação de nanopartículas em laboratório, atribuindo-se funções à sua superfície pela adição de grupos químicos capazes de atrair as partículas virais e se conectar a elas. Esse efeito estérico, relacionado ao fato de cada átomo dentro de uma molécula ocupar uma determinada quantidade de espaço na superfície, impede que o vírus chegue até o alvo, as células, e se ligue a ele, porque já está ‘ocupado’ pela nanopartícula”, explica o pesquisador Mateus Borba Cardoso, coordenador do estudo.
Com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), os cientistas sintetizaram nanopartículas de sílica, componente químico de diversos minerais, e avaliaram sua compatibilidade com dois tipos de vírus. A eficácia antiviral foi avaliada em testes in vitro com os vírus HIV e VSV-G – que causa estomatite vesicular – infectando células do tipo HEK 293, cultura originalmente composta de células de um rim de um embrião humano. As partículas virais foram preparadas para expressar uma proteína fluorescente que muda a coloração das células infectadas, permitindo que os pesquisadores “seguissem” a infecção.
É a mesma estratégia adotada pelos pesquisadores que usam nanopartículas para levar medicamentos quimioterápicos em altas concentrações até as células cancerígenas, evitando que as saudáveis sejam atingidas, o que minimiza os efeitos da quimioterapia.
“As nanopartículas devidamente funcionalizadas e as partículas virais passaram por um tempo de incubação para que interagissem umas com as outras em função das propriedades de superfície de ambas. Quando existe muita atração, provocada pelos grupos químicos presentes na superfície das nanopartículas, a preferência do vírus é de se ligar a elas e não às células”, afirma o pesquisador.
Segundo ele, as nanopartículas chegaram a reduzir a infecção viral em até 50%, demonstrando a eficiência da estratégia. “Esse resultado poderia chegar a 100% se aumentássemos a quantidade de nanopartículas funcionalizadas no período de incubação, mas os testes são realizados em uma faixa otimizada de inativação viral, para que possam ser observados os efeitos nas células atingidas pelos vírus, realçando as diferenças para fins de comparação.”
Mateus explica que a estratégia poderia ser usada, por exemplo, para detectar e eliminar vírus em bolsas de sangue antes de transfusões. Para isso, acrescenta, estão sendo estudadas nanopartículas magnéticas que, uma vez dentro do sangue contido na bolsa, se ligariam aos vírus, inativando-os e sendo posteriormente separadas do sangue por um ímã, levando as partículas virais. A afinidade entre os grupos químicos carregados pelas nanopartículas e as partículas virais também poderia servir ao desenvolvimento de novas técnicas de detecção do HIV e de outros vírus.
Os resultados foram publicados no periódico científico Applied Materials & Interfaces. Além de Mateus Cardoso, assinam o artigo os pesquisadores Juliana Martins de Souza e Silva, Talita Diniz Melo Hanchuk, Murilo Izidoro Santos, Jörg Kobarg e Marcio Chaim Bajgelman. O texto está disponível neste link.
Fonte: Agência Fapesp
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