Vídeos divulgados por um grupo antiaborto chamaram a atenção recentemente para uma prática pouco conhecida: a compra, a venda e o uso em pesquisas de tecidos fetais adquiridos de clínicas de aborto. O grupo responsável pelos vídeos acusou a organização Planned Parenthood dos EUA de vender tecidos fetais para fins lucrativos, o que é ilegal. A empresa rejeita a acusação.
Cientistas de grandes universidades e laboratórios governamentais vêm usando tecidos fetais há décadas, sem fazer alarde. As empresas que obtêm o material fetal de clínicas e o vendem a laboratórios existem em uma área legal cinzenta. As leis federais dos EUA dizem que elas não podem lucrar com o próprio material fetal, mas a lei não especifica quanto elas podem cobrar pelo processamento e transporte desses materiais.
Os Institutos Nacionais de Saúde gastaram US$ 76 milhões em 2014 com pesquisas que usaram tecido fetal, com doações feitas a mais de 50 universidades.
Cientistas dizem que o tecido fetal é uma fonte riquíssima e singular das células-tronco que estão na origem de tecidos e órgãos do corpo. Segundo eles, o estudo de seu desenvolvimento pode fornecer indícios sobre como podem ser “cultivados” tecidos para substituir partes do corpo que entraram em falência.
Para os pesquisadores, com o tempo é possível que células-tronco derivadas de tecidos adultos possam tomar o lugar dos tecidos fetais, mas a ciência ainda não é capaz de fazer isso.
Os tecidos fetais só podem ser usados com o consentimento da mulher que realiza um aborto. Alguns pesquisadores recebem os tecidos de clínicas de aborto existentes em suas próprias instituições ou de bancos de tecido mantidos por algumas universidades. Muitos compram o tecido de empresas que atuam como intermediárias.
Essas empresas pagam taxas pequenas –geralmente US$ 100 ou menos por espécime– a provedores de aborto, como a Planned Parenthood, que afirmam cobrar apenas o necessário para cobrir seus custos. As empresas então processam os tecidos e os vendem a cientistas a preços mais altos, que refletem o processamento.
De acordo com Arthur Caplan, diretor da divisão de ética médica do Centro Médio NYU Langone, em Nova York, os valores –que podem chegar a milhares de dólares por um frasco minúsculo de células– não infringem a lei.
George J. Annas, professor de direito e bioética na Universidade de Boston, declarou: “O que está sendo feito provavelmente está dentro da lei, mas o Congresso não vai gostar”.
Com relação às empresas, ele disse: “Elas não vão gostar de saber que tudo isso está sendo comentado em público. Isso coloca seus negócios em risco. Mesmo que o que elas estão fazendo seja legal, as leis podem facilmente mudar.”
Fonte: Folha de São Paulo