O projeto de monitoramento de peixes (ictiológico), realizado desde 2009 no Baixo São Francisco pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), revelou o retorno da espécie curimatã pioa à região. O peixe é endêmico da bacia hidrográfica do rio São Francisco, onde é popularmente conhecido como bambá piau.
De acordo com relatos de pescadores, comprovados pelo monitoramento, a espécie estava praticamente desaparecida na área. Agora os técnicos da Codevasf vão aprofundar os estudos para identificar se o retorno da espécie está relacionado aos peixamentos realizados pela Companhia, que desde 2014 produz a espécie em centros especializados e a insere no São Francisco por meio de peixamentos.
A captura da espécie foi uma surpresa para a equipe do projeto, formada por técnicos da Codevasf com formação multidisciplinar que atuam no Centro Integrado de Recursos Pesqueiros e Aquicultura de Itiúba (Ceraqua São Francisco), centro tecnológico e científico da Codevasf localizado em Porto Real do Colégio (AL).
Segundo pescadores da região, a espécie prefere locais mais profundos, com pedras e correnteza. Diante disso, os técnicos do Ceraqua São Francisco trabalham com a hipótese de reaparecimento da curimatã pioa e de aumento da população como resultado dos peixamentos da Codevasf, já que o trecho em que o peixe foi capturado não é o mais comum para essa espécie.
“Em 2015, conseguimos capturar no trabalho de monitoramento duas espécies nativas que antes não apareciam: a matrinxã e a bambá piau. O monitoramento teve início em 2009, e desde então essas espécies não eram encontradas”, explica o engenheiro químico Marcos Vinícius Teles Gomes, Doutor em Biotecnologia e coordenador do projeto de Monitoramento Ictiológico realizado pela Codevasf.
No trabalho de captura, são utilizadas redes com malhas que variam de três a 16 centímetros entre os nós, mantidas em trechos do rio São Francisco por aproximadamente 14 horas. “Geralmente, colocamos essas redes em locais de remanso, com águas mais calmas, para que não sejam arrastadas rio abaixo.”
De acordo com Gomes, a partir de estudos de biologia pesqueira, serão investigadas a estrutura das populações existentes e introduzidas, a captura por unidade de esforço em número e biomassa de peixes, estágios de maturação, biometria e relações tróficas.
“Em parceria com a Universidade Federal de Sergipe (UFS), realizamos estudos de biologia molecular, com o intuito de determinar se um indivíduo capturado no rio é resultado dos peixamentos realizados pela Codevasf. Coletamos amostras da calda dos reprodutores utilizados no Ceraqua para comparar com o material genético das espécies capturadas no rio São Francisco e determinar o grau de parentesco”, diz o engenheiro químico.
O pescador José Lessa pesca desde os dez anos com o pai. Hoje, com 72 anos, ele sente a falta da bambá piau (curimatã pioa). “Tudo eu conheço do rio. Sei pescar. Sei nadar. Tudo eu faço. Então, para mim, a bamba piau estava extinta, pois não era encontrada”, afirma em uma banca de peixe em Porto Real do Colégio, cidade localizada às margens do São Francisco.
Para o presidente da Colônia de Pescadores Z-35, Lealdo Vilela, não é fácil diferenciar a xira, como é conhecida na região a espécie curimatã pacu, da curimatã pioa. Isso pode dificultar para o pescador o reconhecimento da espécie que está sendo capturada na pesca. “Por toda a vida, a minha profissão foi pescador. Já pesquei no mar. Já pesquei em águas doces. Para nossa experiência na pesca aqui no Baixo São Francisco, especialmente em Porto Real do Colégio, teríamos como reconhecer esse peixe se fosse criado em cativeiro. Ela pode até ser encontrada no rio, mas passa despercebido como se fosse a xira ou o bamba. Quando o pescador pega uma xira, fica com tanta alegria que não repara qual pescou. Prestando atenção, você verá que existe mesmo uma diferença”, afirma Vilela.
O Centro de Aquicultura de Itiúba realiza a reprodução artificial em laboratório de espécies de peixes nativas do rio. “A Codevasf vem realizando a recomposição da ictiofauna, reparando danos causados ao ambiente aquático no âmbito do Programa de Revitalização da Bacia do Rio São Francisco. Esse resultado aponta que o trabalho de peixamentos está dando um retorno positivo ao repor o estoque natural de espécies ameaçadas de extinção, entre essas a curimatã pioa”, afirma Álvaro Albuquerque, chefe do Centro. “Apesar de a quantidade de peixes que colocamos ser reduzida em comparação com a quantidade reproduzida naturalmente na piracema, vemos resultados importantes com a curimatã pioa de que há reparação aos danos sofridos pelo rio São Francisco”, acrescenta.
Outras espécies ameaçadas de extinção ou com estoque pesqueiro reduzido na região do Baixo São Francisco também são objeto de reprodução artificial e de ações de repovoamento, como a matrinxã e a curimatã pacu. Há ainda espécies como o surubim e o mandi que estão sendo estudados para domínio da tecnologia de propagação artificial em maior escala. O sucesso dos trabalhos de monitoramento ictiológico que são conduzidos pela Codevasf contam com a importante participação de outras instituições, como a Universidade Federal de Sergipe (UFS) e a Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
Curimatã pioa
A curimatã pioa, cujo nome científico é Prochilodus costatus Valenciennes, é uma espécie de peixe endêmica da bacia do rio São Francisco, migradora e detritívora, ou seja, alimenta-se de restos orgânicos, que pode alcançar até 6 quilos de peso corporal. Durante o período de piracema, a espécie realiza grandes migrações com o estímulo natural à ovulação. A partir de barramentos no rio São Francisco, essa espécie praticamente desapareceu da região do Baixo São Francisco, sendo muitas vezes desconhecida pelos pescadores mais jovens e comunidade em geral.
Na avaliação do diretor da Área de Revitalização das Bacias Hidrográficas da Codevasf, o engenheiro de pesca Eduardo Motta, a tecnologia de reprodução artificial, dominada pela Companhia desde a década de 1970, está sendo fundamental para reverter o quadro de reduzido estoque pesqueiro de espécies nativas do rio São Francisco.
“Para reverter esse quadro, as equipes técnicas dos Centros Integrados de Recursos Pesqueiros e Aquicultura da Companhia passaram a intensificar a tecnologia de reprodução artificial para produção de alevinos de espécies nativas, que são inseridas em grande escala na natureza por meio de peixamentos públicos realizados pela empresa com a participação da comunidade ribeirinha”, aponta Motta.
Fonte: Portal Brasil, com informações da Codevasf